Ser perfumista é caminhar entre o dom e a técnica, unindo inspiração e conhecimento para transformar emoções em fragrâncias que contam histórias únicas. Daniela Bitelo

A profissão de perfumista é frequentemente envolta em um misto de fascínio e mistério. Afinal, será que a habilidade de criar fragrâncias extraordinárias é algo inato, ou é resultado de aprendizado e prática? Para muitos, ser perfumista parece um caminho reservado a uma elite privilegiada, com formação em instituições renomadas como o ISIPCA. Mas será que o talento, a criatividade e a paixão não têm o mesmo peso? Este texto é um convite para debatermos as barreiras, os preconceitos e as soluções criativas que definem essa profissão, especialmente para nós, brasileiros.

O Mito da Exclusividade: Nascemos Perfumistas?

Muitos acreditam que a capacidade de criar fragrâncias é um dom inato, reservado a poucos. Mas será mesmo? Embora algumas pessoas nasçam com uma sensibilidade olfativa mais apurada, a habilidade de criar perfumes vai muito além disso. É uma arte que exige estudo, prática e dedicação.

Existem histórias de grandes perfumistas que não seguiram o caminho tradicional. Quentin Bisch, por exemplo, começou no teatro e, com muito esforço, se tornou um dos grandes nomes da Givaudan. Isso prova que a paixão e a persistência podem abrir portas, mesmo para aqueles que não possuem o “background ideal”. Como perfumistas brasileiros, temos algo que nos diferencia: nossa criatividade e talento. E isso não deve ser subestimado.

As Barreiras da Formação Tradicional

Arquivo pessoal. ISIPCA – Dez 23

A formação tradicional para perfumistas é, sem dúvida, elitista e excludente. Segundo a revista NEZ, instituições como ISIPCA, GIP e ESP têm custos exorbitantes que chegam a mais de 30.000 euros. Além disso, os processos seletivos são altamente restritivos, com vagas limitadas e uma preferência por alunos com formação científica. Esse modelo favorece os que têm privilégios financeiros e exclui talentos que poderiam brilhar na profissão.

Historicamente, a profissão era passada de pai para filho, mantendo a perfumaria como um “clube fechado”. Mesmo hoje, perfis atípicos enfrentam resistência para ingressar no mercado. É frustrante pensar que tantos talentos são perdidos devido a essas barreiras.

O Orgulho de Ser Perfumista Brasileiro

Como latinos, enfrentamos desafios e preconceitos no mercado internacional — uma barreira que muitas vezes se apresenta de forma sutil, mas é sentida profundamente. Somos, por vezes, subestimados, vistos como incapazes de competir com os grandes nomes da perfumaria europeia. Já ouvi comentários sobre perfumistas renomados que só foram reconhecidos após conquistarem vendas extraordinárias — como se o sucesso fosse uma imposição inevitável.

Mas quem disse que talento e criatividade têm nacionalidade?

Nós, brasileiros, somos criativos por natureza. Somos capazes de inovar, mesmo com recursos limitados. Se vivemos da criação de fragrâncias, se dedicamos nossas vidas a isso, temos todo o direito de usar o título de perfumista. E devemos usá-lo com orgulho, mas também com a humildade necessária para continuar aprendendo com aqueles que têm mais experiência.

O Que Nos Separa e Como Superar

O que nos separa dos grandes mestres da perfumaria não é uma questão de talento, mas de acesso ao conhecimento e à prática intensiva. A boa notícia é que podemos superar essas barreiras com soluções criativas:

• Cursos Acessíveis: Precisamos de formações mais curtas, práticas e acessíveis financeiramente para democratizar a profissão.
• Estudos Autodidatas: Livros, materiais on-line e práticas independentes são ferramentas valiosas para quem não pode acessar as instituições tradicionais.
• Estudos Científicos: Apesar de algumas pessoas minimizarem a importância da química, ela é fundamental para criar fragrâncias seguras e inovadoras. Estudar química é uma vantagem competitiva.
• Comunidade Colaborativa: Perfumistas brasileiros podem compartilhar conhecimentos, formar grupos de estudo e criar redes de apoio para crescer juntos.

O Equilíbrio entre Humildade e Autoconfiança

Aprender com os grandes mestres é essencial. Eles têm muito a ensinar, especialmente sobre as nuances técnicas e os segredos do mercado internacional. No entanto, é importante equilibrar essa humildade com autoconfiança. Nós, brasileiros, temos o direito de ocupar nosso espaço na perfumaria global.

Se sou melhor que o François Demachy? Claro que não! Ainda me faltam algumas encarnações e oportunidades para chegar lá. Mas uma coisa eu sei: se eu crio bem, dá licença, porque sou brasileira, criativa e talentosa, e sei fazer bonito. Essa confiança, combinada com humildade e determinação, é o que acredito que precisamos para crescer enquanto comunidade e mostrar ao mundo toda a força e originalidade da perfumaria brasileira.

Para Inspirar

Se o talento para criar fragrâncias é uma combinação de predisposição natural e aprendizado, então todos têm a possibilidade de se tornar perfumistas. A verdadeira questão é: como podemos democratizar essa profissão e torná-la acessível a todos que amam a arte de criar perfumes?

O Brasil já demonstrou sua capacidade de brilhar no cenário internacional, com talentos que alcançam excelência e reconhecimento graças à dedicação, criatividade e paixão. Isso nos inspira a acreditar que o talento brasileiro pode competir em qualquer lugar do mundo.

Com nossa criatividade única e resiliência, seguimos construindo um legado na perfumaria. Agora, é hora de nos aperfeiçoarmos ainda mais e abrirmos caminhos para as futuras gerações, mostrando ao mundo que o Brasil também é uma terra de grandes perfumistas.

Quer saber mais sobre como ingressar no mundo da perfumaria? Compartilhe suas dúvidas ou experiências nos comentários. Vamos juntos desmistificar essa profissão e construir um mercado mais inclusivo e criativo!